‘Me leva no lugar dela’: filhas compartilham como o amor materno permanece após a perda para a Covid

  • 11/05/2025
(Foto: Reprodução)
Célia e Claudia Maria foram vítimas da pandemia em Uberlândia, mas deixaram um legado inspirador para as filhas seguirem em frente como mães dedicadas e amorosas. Célia e Bruna (à esquerda) e Graziela e Claudia (à direita) compartilharam a luta contra a Covid-19, mas as mães não resistiram Arquivo pessoal Cinco anos após a pandemia de Covid-19, o Dia das Mães ainda é vivido com um aperto no peito por quem não pôde receber um último abraço de despedida. Para Bruna Santana, a prece da mãe pedindo para trocar de lugar com a filha na UTI ainda ecoa na memória. Já Graziela Gonzaga revive, vez ou outra, a notícia paralisante de que a mãe havia partido enquanto ela própria também lutava pela vida. Moradoras de Uberlândia, as duas são sobreviventes da maior tragédia sanitária do século, que desde 2020 tirou a vida de mais de 3,6 mil pessoas só na principal cidade do Triângulo Mineiro. Aos poucos, elas encontram maneiras de ressignificar a dor da despedida precoce, cultivando o legado de amor deixado pelas matriarcas e transformando a experiência da maternidade com seus filhos. 🔔 Receba no WhatsApp as notícias do Triângulo e região A oração poderosa de uma mãe O diagnóstico de Covid na família Santana veio após o Natal de 2020. A doula Bruna Santana de Oliveira, de 34 anos, foi a primeira a apresentar sintomas e, em 2 de janeiro, precisou ser internada diretamente na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), devido à saturação de oxigênio de 81%. Antes da internação, Bruna conseguiu enviar um áudio no grupo da família para expressar seu amor e pedir que, se algo acontecesse, sua mãe, Célia Maria de Oliveira, de 53 anos, cuidasse do primogênito João Gabriel e lembrasse o menino do quanto ela o amava. Na época, Bruna ainda amamentava o pequeno, e aquela era a primeira vez que se distanciava dele. Ao receber alta, no dia 7 de janeiro, Bruna soube pela irmã e pela madrinha que a mãe havia reagido à condição da filha com muito choro, mas também com uma oração poderosa. Como mãe e avó que ama incondicionalmente, Célia pediu a Deus para trocar de lugar com a filha. Ela falou: “Deus, se for pra levar minha filha, me leva no lugar dela, porque ela tem um filho pequeno para cuidar e quem vai criar ele é ela”, contou Bruna. Três dias após Bruna retornar para casa, Célia precisou ser internada na UTI, com saturação de 74% e os pulmões comprometidos. No dia 20 de janeiro — na mesma semana em que a vacina contra a Covid chegava ao Brasil — a família recebeu, sem sequer ter podido se despedir, a notícia da morte. “Ela tinha 35 anos quando perdeu a mãe. Sabia a falta que isso fazia na vida dela e a falta que faria na minha. Mesmo assim, pensou na ausência que eu causaria na vida do João, que ainda era só um bebê. Isso, para mim, foi a maior prova de amor que eu tive na minha vida. É muito difícil não tê-la aqui, mas, nossa, como ela me ensinou sobre esse amor de mãe”, refletiu a filha. Um leito para uma despedida A podóloga Graziela Bigaton Rosante Gonzaga, de 49 anos, enfrentou a Covid-19 ao lado da mãe no final de março de 2021. Claudia Maria Bigaton Rosante havia passado o primeiro ano da pandemia confinada na casa da irmã, em Araxá (MG), na tentativa de evitar o contágio. A saudade falou mais alto, e dona Claudia, 69 anos, voltou para Uberlândia para visitar as netas. Pouco tempo depois, o pai de Graziela apresentou os primeiros sintomas, seguido por mãe e filha, que também testaram positivo para a doença. O estado de saúde de ambas se agravou e elas ficaram internadas praticamente juntas. Em meio à superlotação de leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI), as pacientes foram colocadas frente a uma escolha cruel: havia naquela ocasião apenas uma vaga disponível no antigo Hospital Santa Catarina, então adaptado para atender casos graves de Covid-19 em Uberlândia. “A médica pegou firme no meu braço e, chorando, disse: ‘Graziela, eu estou tendo que escolher entre você e sua mãe. E você vai lá, porque a probabilidade de você sobreviver é maior.’ Naquele momento, tudo acabou para mim. Não quis ver minha mãe intubada [antes de ser transferida], porque algo no meu coração dizia que ela não iria sobreviver”, recordou. De um lado, a angústia de se despedir à distância daquela que sempre foi sua maior fonte de inspiração. Do outro, a força materna que a impulsionava a continuar, já que, antes de ser internada, Grazi tinha prometido à filha mais nova que melhoraria e voltaria para casa. Cerca de dez dias depois, a podóloga foi extubada, porém a notícia da morte ainda demorou ser comunicada. Mesmo sem confirmação, ela sentia que algo havia mudado. Sem forças para lidar com o luto naquele momento e com duas filhas pequenas para cuidar, se concentrou na própria recuperação. Não pôde comparecer ao velório; foi o marido quem registrou o enterro, para que ela tivesse ao menos uma imagem daquela despedida silenciosa. O luto, contudo, não veio de imediato. Apenas quase um ano depois, quando começou a se reerguer física e emocionalmente, conseguiu encarar a ausência da mãe. LEIA TAMBÉM: Rumo à independência: como duas mulheres transformaram a vida financeira após o divórcio Mulheres na ciência: professora da UFU desenvolve projeto com alunas de escolas públicas Mãe apoia filha com paralisia cerebral e as duas se formam na faculdade de direito O legado de amar e cuidar Falar sobre as mães é preservar um legado de amor que ultrapassa o tempo e a ausência. Célia e Claudia deixaram esse exemplo às filhas, que agora nutrem as novas gerações da família com muito afeto e dedicação. "Minha referência total de cuidado, de força... se alguém precisasse dela, minha mãe tava sempre disponível para ajudar. Era muito altruísta. Com a gente, então, nem se fala. Sempre tinha um colo pra onde fugir e um abraço para comemorar. O maior legado que a minha mãe deixou pra mim foi esse amor materno, que é incomparável”, pontuou Bruna. Graziela lembrou com emoção do vínculo intenso que mantinha com a mãe e o que ela deixou. “O luto é pra sempre, principalmente quando a gente tem uma ligação muito forte, nós éramos muito apegadas. Minha mãe era um ser de muita luz, dona de um abraço que curava qualquer mal. Se somos o que somos, com respeito, luta e caráter, foi por ela que largou a vida toda para cuidar de mim e da minha irmã. Foi um legado de amor e esse amor transbordava”, disse, emocionada. Claudia e a família Gonzaga Arquivo pessoal Um novo significado para o Dia das Mães Desde a perda das mães para a Covid-19, Graziela e Bruna passaram a viver o Dia das Mães de forma diferente, mas ainda carregam consigo a essência de quem as ensinou a amar. Na maternidade, encontraram um caminho para ressignificar o luto e hoje se dedicam a serem mães incríveis para seus filhos. A data continua especial para Graziela, pois sempre quis ser mãe e sente que sua própria mãe continua ao seu lado. "Ser mãe foi a realização da minha vida e ela estava comigo em todos esses momentos. É como se ela ainda estivesse aqui. A gente sente um vazio, que não é preenchido nunca mais, mas tenho certeza que ela está sempre comigo". Para Bruna, que também é mãe de dois, o primeiro e o segundo ano de Dias das Mães foram especialmente difíceis, mas hoje ela encontra forças nos filhos e nas memórias que preserva. "Eu não tenho a minha mãe aqui, mas eu tive durante 30 anos e eu ainda sinto a ligação muito forte com ela. Mas o Dia das Mães pra mim agora tem novo significado. Quero viver ele realmente como mãe, não mais como filha. Sei que o que ela mais queria era que eu ficasse bem”. Célia e a família Santana de Oliveira Arquivo pessoal Lembrar e acolher para nunca esquecer Apesar do tempo, para quem perdeu alguém na pandemia, o luto ainda é presente. E, segundo Graziela e Bruna, é preciso continuar falando sobre isso não apenas para lembrar, mas também para acolher quem ficou e valorizar o que foi vivido. “É preciso lembrar mesmo das pessoas que se foram, porque eu acredito que enquanto a gente conversa, enquanto a gente lembra delas, em cada detalhe, cada lembrança é uma forma de manter a história delas viva. Adoro lembrar das histórias, mesmo que me emocione, mas eu me emociono num lugar de saudade e de alegria por ter vivido”, comentou a doula. Graziela ainda acrescentou que, na perda, também encontrou aprendizado e uma vontade renovada de amar mais a vida, exatamente como dona Claudia sempre fez questão de ensinar à família. “A gente tem que viver o luto, mas a gente tem que se reerguer, a gente tem que orar por essas pessoas que se foram e lembrar que tudo que elas queriam era que a gente seguisse em frente, que fôssemos pessoas de bem”. A pandemia da Covid-19 deixou milhares de filhos órfãos, marcando nossa história com uma tragédia que ainda permanece viva na memória de quem perdeu alguém querido. Mas ao conhecer histórias como as de Bruna e Graziela, percebemos que é possível enxergar além da dor e do luto. As ‘Marias’ — Claudia e Célia — não foram apenas números em uma crise sanitária. Foram mulheres extraordinárias, símbolos de um amor capaz de transcender a ausência física. Essas mães, levadas pelo coronavírus, representam um amor que permanece vivo nos gestos, nas lembranças e na celebração do Dia das Mães que suas filhas agora compartilham com os próprios filhos. Até porque o amor de mãe não se apaga. Ele segue iluminando vidas, atravessa gerações e transforma saudade em forças para seguir a jornada. Faz 5 anos do primeiro caso de Covid-19 em Uberlândia 📲 Siga as redes sociais do g1 Triângulo: Instagram, Facebook e Twitter 📲 Receba no WhatsApp as notícias do g1 Triângulo VÍDEOS: veja tudo sobre o Triângulo, Alto Paranaíba e Noroeste de Minas

FONTE: https://g1.globo.com/mg/triangulo-mineiro/noticia/2025/05/11/me-leva-no-lugar-dela-filhas-compartilham-como-o-amor-materno-permanece-apos-a-perda-para-a-covid.ghtml


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